TEMPOS DE MÚSICA – Parte 5
Devo à minha avó Nazinha os
primeiros ensinamentos no piano, mas além disso, a importância de ter contato
com os sons musicais ouvindo Chopin, Bach, Debussy e outros. Ela tocou piano até mais de 90 anos de idade. E na verdade nunca teve professor. Assistia às aulas de sua irmã Zindoca e mais tarde se sentava ao piano e estudava sozinha. E como tocava bem...
Começando pelos clássicos então,
lembro-me bem de, aos 12 nos de idade, ter ido ao Theatro Municipal assistir a
um concerto do ucraniano, radicada no França, Alexander Brailowsky, então um
dos mais famosos pianistas do mundo, e reconhecido como o maior intérprete de
Chopin na ocasião. Foi o primeiro contato com o Teatro e com um público de
concerto.
A partir daí frequentei os
Concertos para Juventude, apresentados nas manhãs de domingo naquele Teatro
pelo lendário maestro Eleazar de Carvalho.
Por essa época eu já aprendia
acordeon, paralelamente às aulas de piano, e ensaiava meus primeiros arranjos
de ouvido em alguns sambas-canção de sucesso.
Ouvia muito rádio e aos domingos
à noite não deixava de sintonizar a Radio Nacional que tinha um programa
chamado Campeões da Popularidade, apresentado pelo compositor Jair Amorim.
Nessa mesma época conheci, no São José o Paulo Cesar Rodrigues, que morava no Grajaú e que se tornou um grande e inseparável amigo de minha adolescência. Ele tinha uma bela voz e até poderia ter estudado canto, com sucesso. Eram frequentes as reuniões em nossas casas, quando varávamos as noites cantando e nos acompanhando ao violão. Muitos amigos compartilhavam esses momentos.
Foto na frente da casa do Paulo, na rua Grajaú. Eu, Maria Thereza (sua irmã), Paulo Cezar, Norma (sua prima) e o amigo Fernando Malheiros
Graças a ele tomei conhecimento e
gosto pela ópera e operetas e passamos a frequentar as récitas do TM e de
outros menores (República, João Caetano e Recreio).
Nas operetas as estrelas eram o
Pedro Celestino (irmão do Vicente) e a Mione Amorim. Melodias leves, vienenses,
como a Viúva Alegre e Princesa das Czardas
Em 1954 assisti minha primeira
ópera, La Bohème de Puccini, deixou-me absolutamente apaixonado. Ainda me
lembro de um “baixo” búlgaro chamado Boris Christoff, que ficou alisando seu
casaco durante uns 10 minutos em cena aberta e aí cantou a famosa área da
“Vecchia Zimarra”. O Teatro veio abaixo.
Mas um inesquecível acontecimento
foi a Carmen, com o grande Mario del Monaco e a
Giulietta Semionato. Um luxo. E aí assisti a uma situação absolutamente
inédita e que, até onde sei, nunca mais se repetiu no nosso maior Teatro. Os produtores, pressionados por política (já
havia isso então), substituíram a cantora que faria a personagem Micaela,
colocando em seu lugar a Lia Salgado, que era esposa do Ministro da Educação,
Clovis Salgado.
A plateia não se conformou e quando
a Lia terminou de cantar sua primeira ária foi estrepitosamente vaiada. Nunca vi nada parecido, nem no Maracanãzinho
anos depois.
Na mesma temporada assisti o Mario Del
Monaco no Il Pagliacci. Ele era para mim o máximo em termos de tenor. Até que
conheci uma dupla: Placido Domingo e Luciano Pavarotti.
Mas deles falarei no capítulo
dedicado aos meus anos em New York.
O grande tenor Mario del Mônaco, no auge de sua carreira
Voltando à década de 50 e ao meu
amigo Paulo Cesar, nós tínhamos um xodó pela Angela Maria. Não perdíamos o seu
programa aos sábados na Rádio Nacional às 14,30, logo antes do famoso Programa
Cesar de Alencar que ia ao ar de 15 às 18 horas.
Ângela Maria, a "Sapoti". Para mim, a maior cantora do Rádio.
Naquela famosa rádio, além dos
noticiários, programas humorísticos (piadas do Manduca, Edifício Balança mas
não cai e PRK-30, de louvor à Marinha, aos médicos (Obrigado Doutor), de variedades
(Nada Além de dois minutos), de calouros (Hora do Pato e Papel Carbono), havia
alguns que abriam espaço para os cantores que detinham um enorme fã clube.
Muito antes de aparecer o Cauby
Peixoto, que mudou o estilo das fãzocas, a Angela Maria já tinha seu programa
sozinha, enquanto a Emilinha e a Marlene vinham a reboque e no meio dos
programas dos animadores Cesar de Alencar e Manoel Barcelos.
Fingiam uma “briga” que na
verdade não havia, mas as fãs se digladiavam e a rádio e a Revista do Rádio
faturavam.
Mas a Angela Maria nos falava ao
coração e ao final dos programas de sábado eu e o Paulo nos falávamos por
telefone e comentávamos sobre as músicas cantadas, a orquestra (que era ao
vivo) e mais alguma coisa diferente que tivesse acontecido.
Até que um dia eu contei para ele
que uma prima tinha decidido seguir a vida artística e que eu achava que ele ia
gostar. E ele não só
ficou fã da Maysa mas também se apaixonou por ela.
Minha querida prima, Maysa, e seus lindos olhos
Passamos a ir juntos a todos os
programas que ela vinha fazer no Rio, no rádio e na TV, e ela também se tornou
muito amiga dele.
Continuávamos a gostar da Angela Maria, mas a "chegada" da Maysa esfriou nosso embevecimento por ela.
Mas também seguíamos e apreciávamos as interpretações românticas da Elizete Cardoso, da Nora Ney e da Lana Bittencourt até que chegou a Bossa-Nova e me arrebatou.
A Maysa, graças a seu
relacionamento com o Ronaldo Bôscoli, um dos principais personagens do
movimento, inseriu-se na BN com seu disco cujo título e principal música era “O
Barquinho”, com um acompanhamento de piano e orquestra, que não era o padrão da
Bossa Nova. Luiz Eça ao piano e no arranjo, Maysa apaixonada e músicas
maravilhosas, principalmente da dupla Menescal e Bôscoli, tornaram o vinil marcante
na história da Bossa-Nova.
Pouco antes ela havia gravado Tom Jobim e Dolores (Por causa de você) e Tom e Vinicius (Se todos fossem iguais a você). Era uma interpretação personalíssima e diferente das outras cantoras da época. Mas havia espaço para todos os estilos, João Gilberto, Nara Leão, Carlos Lyra, Sylvia Telles e o próprio Vinicius que adorava cantar com eles todos, ao vivo e em gravações, até que achou um parceiro fantástico, Toquinho, revelado pelo Chico Buarque.
A vida me proporcionou o
privilégio de conviver com muitos dos acima citados, além do Agostinho dos
Santos, Tito Madi, Evaldo Gouveia, Sacha Rubin, Billy Blanco, Consuelo Villar,
Elvert Brandão, Osmar Milito e “last but not least” minha grande amiga, até os
dias de hoje, Claudette Soares.
Na próxima parte vou descrever cada um deles e suas virtudes e características.
O Paulo Cezar não embarcou na Bossa-Nova, mas agregou ao seu repertório romântico músicas francesas e italianas (a primeira vez que ouvi Nel blu di pinto de blu foi em sua casa). Da Maysa ele cantava divinamente o Ne me quites pas.
Lamentavelmente, como já contei
antes, meu amigo Paulo Cesar faleceu prematuramente, mas a amizade já havia se
estendido para nossas mães, e continua até hoje com sua irmã Thereza e sua sobrinha
Adriana.
Adriana, D. Lila e Maria Thereza (sobrinha, mãe e irmã do Paulo Cezar) e mamãe
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