TEMPOS DE MÚSICA – PARTE 1



 Audição de piano - Professora. Nancy - Grajaú - cerca de 1950


Vou interromper a narrativa da cronologia das minhas nove décadas para falar um pouco da Música na minha vida, o que vivi, convivi e assisti, além de algumas histórias mais ou menos conhecidas.

Dos 5 aos 12 anos eu estudei piano com várias professoras, a primeira durante um verão em Friburgo e a última, uma querida amiga Ana Maria Porto, que também lecionava no Conservatório. As aulas sempre foram particulares com todas elas. Desde o início só músicas clássicas.

Quando ganhei o Acordeón no início dos anos 50, foi paixão à primeira vista. Na ocasião um amigo que fiz no Externato e que morava no Grajaú, Paulo Cezar Rodrigues, foi lá em casa e tocou uma música que encantou a nós todos. Esse foi o primeiro incentivo porque eu ainda estava muito ligado no piano.

O Paulo, grande amigo que tive na vida, tocava acordeón, violão e cantava muito bem. Tipo seresteiro, valsas e canções, e depois sambas-canção. 

A partir daí fiquei indagando qual seria o melhor método e onde aprender aquele instrumento e, de repente surgiu o anúncio do  Concerto dos Mil Acordeons no Teatro Municipal.

O Prof. Mário Mascarenhas teve a grande sacada de reunir seus alunos da Academia da Cinelândia e todos os alunos das academias que vinha abrindo há meses em todos os bairros do Rio de Janeiro.

Primeiro ele certificou as “professoras” que iam abrir essas Academias. Depois ele as pediu para ensaiar um determinado repertório, que seria tocado em conjunto pelos alunos. Entre uma e outra execução ele se apresentava sozinho ou com uma ou duas alunas mais destacadas, entre elas uma com quem casaria pouco depois, e que ficou conhecida até no Teatro Revista como Conchita Mascarenhas.

Prof. Mário Mascarenhas e sua mulher, Conchita


Fiquei tão empolgado que no dia seguinte não sosseguei até que conseguir contato telefônico com a Academia Mascarenhas do Grajaú, lá perto da Praça Malvino Reis, e comecei as aulas de imediato.

Pouco tempo depois surgiram as oportunidades: audições, apresentações, idas ao Clube do Guri da TV Tupi etc. até que um dia a professora, Dr. Irma, me perguntou se eu queria animar uma festinha de São João em um pátio de um prédio em Vila Isabel. Claro que aceitei na hora. Preparei o repertório e parti.

Meu pai me levou até lá e depois foi buscar. Foi o primeiro dinheirinho que ganhei com o Acordeón. Depois foram vários cachês inclusive um inesquecível pic-nic no gramado do Parque da Cidade.

Em 1954, na época natalina, a Academia do Grajaú ensaiou um show com seus alunos e alunas. Lembro-me bem que fomos a hospitais e asilos, mas sem dúvida o mais inusitado foi o auditório da Penitenciária da Frei Caneca. Lá estavam os famosos Tenente Bandeira, do crime do Sacopã, o Gregório Fortunato, do crime da Tonelero e o “Coice de Mula” que havia assassinado a pancadas o jornalista Nestor Moreira.

As meninas tocavam acordeon e dançavam ao mesmo tempo. A cada rodada que davam as saias levantavam e os internos iam à loucura...

Em 1955 e eu comecei a tocar em conjuntos musicais, com meu grande amigo e colega do Externato São José, Celso Omena Brando, que brilhava nas guitarras elétricas e havaianas.

Quando surgiu o Rock, na esteira do filme "Balanço das Horas" com trilha do Bill Haley e seus cometas, e logo depois o "Rei do Rock" Elvis Presley, formamos um conjunto de rock pensando em shows e tv.  Os ensaios eram lá em casa e na casa dos amigos, e finalmente fizemos uma apresentação na Associação Atlética Vila Isabel, que ficou registrada na Coluna de Ultima Hora, em 20/8/1957, onde apareço ao lado do nosso vocalista, que mais tarde ficaria famoso como humorista, Paulo Silvino.


Paulo Silvino, vocalista do nosso grupo de Rock em agosto de 1957


Ainda nessa fase do Acordeon, fui apresentado pelo Paulinho d'Ávila, amigo e vizinho do Grajaú, a um grupo capitaneado pela Professora Madalena, esposa do Prof. Micaldas do Colégio Militar, que tinha por objetivo montar shows beneficentes, com números de música, dança e canto. O grande sucesso entre os componentes desse grupo era um aluno do CM que na época era conhecido como “Papai Noel” e depois ficou nacionalmente famoso pelo apelido de “Castrinho”.

Nos shows eu tinha que contracenar com ele tocando acordeon e até cantando, imitando dupla caipira.

Fizemos vários shows, inclusive em Teatros como o João Caetano e o Mesbla.

Lamentavelmente não tenho nenhum registro fotográfico e depois de uma boa temporada de shows o grupo se desfez e nunca mais os encontrei. 

O Castrinho já estava se envolvendo com o Teatro Revista, o Paulo Silvino, idem, e logo depois ambos foram para a TV e alcançaram o estrelato.

Nosso conjunto de bailes era comandado pelo baterista, Maurício de Abreu, que morava na Conde Bonfim. O crooner tinha um nome exótico, Luar, e eu revezava acordeon e piano. Tinha um sopro de clarineta ou sax, Tristão, que morava naquela rua da praça em frente à Ordem Terceira da Penitência.  Ensaiávamos muito também na casa do Celso, que tinha uma área aberta no teto de sua casa da Barão de Itapagipe

Como não havia compromisso de exclusividade, nas manhãs de domingo combinava com o Celso Brando e mais um ou dois amigos, e íamos animar as "Domingueiras Dançantes" da Associação Atlética do Grajaú.


            Celso Brando, Rostan e eu no palco da Ass. Atlética do Grajaú - Manhã Dançante

Não posso deixar de mencionar como foi importante a pesquisa para construir um repertório musical que atendesse a todos esses segmentos. Músicas dançantes, brasileiras e estrangeiras, rocks e baladas, boleros em quantidade, que junto com sambas-canção e sambas eram obrigatórios e solicitados.

Ouvia rádio sempre que podia e escutava música na vitrola de meus pais, que tinham bom gosto e  sempre me incentivaram. 

Nessa mesma época um conhecido de minha família, com quem tinha pouco contato por morar em Copacabana, em frente à praça do Lido, apresentou-me a um amigo seu, Djalma Delforge, que morava na Av. Atlântica e que gostava de tocar bateria e tinha um piano em casa.  

Essa apresentação abriu as portas para um mundo diferente, das reuniões e festinhas da Zona Sul, onde conheci muitos músicos amadores que depois ficaram conhecidos e fizeram sucesso. O Djalma tornou-se um amigo para toda a vida e lamento muito que já não esteja entre nós. Permaneço em contato com sua viúva e filhos, e sempre me lembro de nossas reuniões, viagens e aventuras. 

Nessa mesma época, minha prima Maysa decidiu se tornar cantora e lançar seu primeiro disco (Convite para ouvir Maysa) só com composições suas. Eu fiquei apaixonado pelo disco e pela sua voz. Há muito não a encontrava porque ela havia mudado para SP e eu tinha mais contato com seu irmão, Cibidinho, companheiro inseparável nas férias de todos os anos, quando vinha para o Rio e ficávamos em casa de minha Tia Judith na Lagoa.   

Acompanhei o início de sua carreira e primeiros programas na TV, até que no dia do aniversário de sua avó, que era irmã da minha, aconteceu o esperado reencontro. E daí para frente nunca mais deixamos de nos falar ao telefone, nos aniversários dela dia 6 de junho, e em todas as apresentações que vinha fazer no Rio. 

Infelizmente o único registro fotográfico que tinha com ela, no Aeroporto do Galeão, no dia de seu embarque para o Japão no vôo inaugural da linha aérea para aquele País pela Real Aerovias, perdeu-se em uma das muitas mudanças que fiz. Meu inesquecível amigo, Paulo Cezar Rodrigues, estava nessa foto conosco. 

Em 1958, ano em que terminaria o científico, depois de 9 anos cursando o Externato São José, onde fiz amigos para toda a vida, aconteceu uma virada completa na minha cabeça musical: surgiu a Bossa Nova. 





 

 

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